O Tempo Não Cura, Ele Alimenta Suas Feridas

O Tempo Não Cura, Ele Alimenta Suas Feridas

Quando começamos, ou continuamos, a deixar pra lá os problemas de nossas vidas, fazendo de conta que nada está acontecendo, várias coisas acontecem. Muitas dessas coisas, ao contrário do que se espera, acabam sendo ruins para nós.

 

Existe duas possibilidades quando tratamos de ignorar o problema. As duas são comumente frequentes. A primeira situação é a pessoa nem ao menos se dar conta que existe um problema. A segunda situação é a pessoa saber que existe um problema a ser resolvido, mas não querer mexer na ferida ou não consegue lidar. Falaremos das duas e você verá que pelo menos a primeira situação é praticamente inerente à condição humana e que, quando tomamos consciência do problema, podemos ou não buscar resolvê-lo.

 

Situação número 1: A ignorância

 

De repente, você se dá conta que está num círculo interminável de relacionamentos fracassados, em que você não é valorizada, que não te fazem se sentir amada. Ou que nunca consegue progredir na vida, apenas patinando por empregos que malemá pagam a comida no fim do mês. Ou quem sabe você tem muitas coisas boas na vida, um bom carro, uma boa casa, um bom emprego, um bom marido, filhos educados, mas não parece ser suficiente.

 

Quando estamos imersos nas experiências de nossas vidas raramente existe aquele tempo que tiramos para nós mesmos com a finalidade de refletir ao menos “Mas por que essa porcaria de situação continua se repetindo na minha vida?”. Geralmente nos damos conta apenas do aprendizado e pronto. E esse aprendizado vem como algo do tipo: “Nenhum homem presta” ou “Não nasci para ser rico” ou “Esse negócio de felicidade na verdade nem sei se existe mesmo”.

 

Aqui introduzo a ideia principal deste texto: o objetivo subconsciente por detrás dos “problemas”. A ignorância do problema nesse momento ocorre por uma excelente execução de estratégia mental. Ou seja, dentro de você tudo o que acontece, acontece porque tem que ser assim e não tem como ser diferente. Você sente como se fosse isso que está aí dentro. Sente como se não existisse algo diferente a ser sentido. Que, no máximo, outras pessoas até podem sentir, mas não você.

 

Entenda, aqui ainda não estamos no momento onde a pessoa toma consciência do problema. Ainda é o momento onde, por exemplo, a mulher apanha do marido e, apesar da dor e de não desejar aquilo para si mesma, acredita que não existe outra forma de relacionamento, porque todos os outros que conheceu foram iguais.

 

Conforme vamos crescendo, vamos sendo expostos a várias experiências. Cada uma dessas experiências nos traz um certo aprendizado. Cada aprendizado é único e individual para cada pessoa. Ou seja, cada pessoa aprende uma coisa diferente em determinada situação. Esse aprendizado é influenciado por diversas variáveis internas e externas, tantas variáveis que se torna praticamente impossível haver aprendizados idênticos em duas pessoas. Mesmo gêmeos univitelinos tiram aprendizados diferentes de suas experiências compartilhadas, e existem diversos estudos que mostram essa complexidade humana.

 

Esses aprendizados vão compondo nossa noção de ser. Em outras palavras, eu sou aquilo que aprendi ao longo de minha vida até hoje. Minhas crenças, emoções, deduções, conclusões, memórias. E, se somos isso que aprendemos a ser, até porque não tem como sermos outra coisa (até mudarmos esse aprendizado interno), é natural chegarmos à conclusão de que aquilo que sentimos e acreditamos hoje seja a verdade para nós.

 

Traduzindo: se eu fui criado para crer que para ser muito rico é preciso trapacear, ou que quem nasce pobre nunca fica rico, eu fui inundado com essa crença e emoção, eu vou acreditar nisso e passar a me comportar hoje com base nessa estrutura interna. Não faz sentido para nós agirmos de maneira diferente, sendo que eu aprendi a ser assim: ser pobre para sempre, até morrer e que, se quiser enriquecer, deverá trapacear.

 

Aliás, nossa mente não entende como sendo seguro fazer algo diferente daquilo que aprendeu a ser. Isso acontece com todas as situações de nossa vida, aprendizados bons e ruins. Melhor ainda, para nossa mente não existe aprendizado bom ou ruim, existe apenas aprendizado. Agora, qual resultado esse aprendizado irá gerar na nossa vida, vai ditar como ele será classificado.

 

Sendo assim, por que muitas vezes não nos damos conta do problema?

– Porque ele não é visto como um problema. Ele é visto como a única forma de ser, agir e sentir.

 

Situação número 2: A tomada de consciência

 

E existem também aqueles momentos em que você simplesmente para e diz: “Já chega! Tem algo de muito errado! Isso não faz sentido! Eu não quero mais isso para minha vida! O que será que eu preciso fazer?

 

Estar consciente do problema. E aqui entenda problema como sendo aquilo que você identifica como o motivo do sofrimento: se relacionar apenas com homens que te batem, ter uma atitude vitimista e reclamona afastando as pessoas ao seu redor, nunca conseguir se organizar financeiramente, não estar feliz com nada na sua vida, ir para o hospital porque acha que está tendo um ataque cardíaco, etc.

 

Estar consciente do problema é o primeiro passo para começar a sair dele. Contudo pode acontecer de você estar consciente de que vive um problema, mas não conseguir sair dele. Você sabe que existe um padrão. As coisas sempre se repetem, mas quando percebe está lá agindo da mesma forma, mesmo tendo prometido para si mesma que faria diferente da próxima vez.

 

Isso acontece exatamente pelo mesmo motivo da Situação 1. Nós somos quem aprendemos a ser. Se esse aprendizado traz consequências ruins no futuro, tanto faz para sua mente subconsciente. Aliás, essa mente mais profunda consegue te influenciar perfeitamente para sempre rodar esse programa interno aprendido. Por exemplo:

 

Uma pessoa enquanto cresce vivencia situações que a faz acreditar ser alguém incompetente, “sem boca pra nada”, que não consegue dar conta das próprias coisas. Como você já aprendeu, esse aprendizado internalizado passa a ser a própria pessoa. No futuro, além desse indivíduo se sentir frequentemente incompetente, não acreditar em si mesmo e autodepreciar, suas atitudes também serão alinhadas a essa condição interna. Ou seja, ele é (se sente) incompetente, logo poderá se atrasar no trabalho, vai deixar de estudar para provas na escola ou faculdade, vai furar compromissos, tudo para reforçar e reafirmar a crença interna preexistente de incompetência.

 

A própria tentativa frustrada de resolver esse problema pode servir de prova para si mesmo de que é um real incompetente: “P*ta m*rda, eu não consigo fazer nada, não mando nem em mim, eu não tenho controle sobre mim mesmo”. Você já teve essa sensação de incompetência para resolver os próprios problema? Especialmente aqueles que se repetem?

 

Não se engane. Estar ciente do problema é um passo importante, mas não faz nem cócegas dentro do processo de resolução. Esse problema é apenas a casca do ovo, a ponta do iceberg, o sintoma. Por trás dele existe um processo de aprendizagem mental automatizado que precisa ser descoberto, compreendido e reeditado para que o problema seja solucionado.

 

Quando existe essa percepção de inabilidade em resolver o problema, algumas pessoas podem tentar “deixar pra lá”. Seguindo o ensinamento da música “deixa a vida me levar, vida leva eu”. Fazendo de conta que o problema não existe ou que a solução é deixar o tempo resolver as coisas.

 

É claro que sobre algumas situações não temos controle. Contudo quando se trata de nossa mente, a tendência é sempre a situação existente ser fortalecida com o passar do tempo, caso nada seja feito. Tanto coisas boas quanto ruins. E aqui, “fazer nada” não existe, pois “fazer nada” é fazer alguma coisa, você estará escolhendo não agir.

 

Resumindo: você escolhe não fazer nada e isso fortalece a cadeia de aprendizado interna que gera o problema.

 

Guarde essa frase:

 

“O tempo não cura, ele alimenta suas feridas”

 

O que pode acontecer também é que a sensação de fracasso constante em lidar com o problema traga uma estafa, uma exaustão. Você pode se sentir cansado de nadar contra a corrente e aí simplesmente escolhe não tentar resolver mais, já que “não tem mais jeito, vai sempre ser assim”.

 

Nas duas situações – na ignorância e na consciência do problema – existe sofrimento. Na primeira situação a pessoa sofre por se ver afogada em problemas que sempre se repetem, sua vida é uma merda e ela se lamenta por isso. Na segunda situação a pessoa sofre por saber que existe um problema que precisa ser resolvido, mas não se sente capaz de sair dele, por desconhecimento ou falta de disposição mesmo.

 

Aqui é importante entender que hoje você pode estar passando por uma situação problemática na sua vida que nunca viveu antes, e então pode achar que não existe nenhum padrão. Mas não é apenas a situação que pode se repetir para apresentar um padrão, aliás ela é pouco relevante. A emoção atrelada a ela é que importa.

 

Como você tem se sentido em cada situação problemática da sua vida? Impotente? Com raiva? Triste? Abandonada? Rejeitada? Incompreendida? Desconfiada? Magoada? Sente algo que não consegue dar nome, mas que é igual nas situações?

 

É para isso que você deve olhar. Mas aqui é importante apenas lembrar: enquanto você não resolver os padrões internos, continuará sofrendo externamente. Consciente ou não do problema. Não se cobre em saber o que está gerando esse problema em sua vida, você não saberá até que faça um tratamento emocional (a não ser que já tenha desenvolvido essa habilidade de tratamento após alguns anos de experiência). De qualquer forma, de nada adianta saber se não resolver. A única coisa que precisa saber agora é:

 

Se não resolver o que está em desacordo aí dentro de você, as coisas aqui fora vão parecer desalinhadas. Mas se lembre, essas coisas estarão desalinhadas em relação aos objetivos conscientes, mas sempre alinhadas com seu conteúdo interno subconsciente.

 

Mude a única parte que realmente importa e que é possível mudar de verdade: seu interior. O resto ou muda e te acompanha ou fica para trás.

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